sexta-feira, 17 de janeiro de 2014

INQUIETAÇÕES  DE  UM  RECÉM  CONVERTIDO
Poucos dias depois de sua conversão assim escrevia TRISTÃO  (21/09/1928) ao amigo Jackson de Figueiredo: "Tenho horror a cultivar a inquietude, a incerteza, mas sinto ser condenado a ser um atormentado, com ares de dogmático e sereno. Hoje, lendo seu artigo sobre o Congresso da Mocidade, fiquei inquieto sobre o que deveria eu ter feito a respeito.  Ainda estou cheio de dedos nesses assuntos de ação católica. O França (Padre Leonel Franca) aconselha deixar-me continuar como até agora, deixando que a fé se infiltre lentamente nas minhas próprias atitudes atuais, nos meus escritos, etc., eu penso que o conselho é sábio. Pois há momentos em que sinto quase que fisicamente a fé se espalhando por meu organismo, deixando de ser  puramente atitude mental, para ser sangue, para ser esquecida. Chesterton teve uma vez uma palavra paradoxal, mas no fundo muito justa sobre a Igreja.  Uma das razões pelas quais me converti à Igreja, disse ele,  foi para não pensar mais na Igreja. Mas tem raízes.  Eu estou começando, apenas começando.  Mas é o essencial, não pensar mais continuamente no problema da fé. E isto me parece um sinal admirável. Estou sentindo que a fé está começando a fazer parte  integrante de mim, como o meu nariz ou o meu temperamento. Há um ano, sobretudo, que vivo com todas as minhas forças voltadas para a fé, para as suas dificuldades, para a sua posição na história, para a sua conciliação com o meu temperamento, com as minhas covardias de sibarita dos jogos puros da razão, com a minha posição humilhante de industrial rico,  e portanto no extremo oposto ao espírito de Cristo, com os meus hábitos mentais de cético, de pagão, etc. Sinto que esse momento está passando. E que a obsessão vai desaparecendo e que uma nova vida vai começando para mim, da qual a fé  faz parte, naturalmente, integrada no todo. Estou sentindo que ela passou a viver em mim, mais do que eu nela. De qualquer coisa  de exterior, de um estado fora de mim do qual eu me aproximava passo a passo, como um nadador exausto, de braçada em braçada,  vem se chegando à praia ou à embarcação, passou a fé a ser  um estado interior, um modo de ser, uma face já agora orgânica do meu ser.  Não preciso mais pensar nela para que a sinta viver. Como não penso mais no meu coração, nem o sinto bater.  A fé é o meo coração da inteligência. Agora só a sentirei se tiver a desgraça de parar de bater. Entretanto, não se esqueça de me prevenir daquilo que você julgar que eu devo fazer, no sentido de  não parecer um católico que tem medo de passar por tal. Não quero passar por um "católico dos domingos", um churchgoer como dizem os ingleses, e nada mais".

Nenhum comentário:

Postar um comentário