quarta-feira, 31 de março de 2010

"O FELIX CULPA"

A chamada pelos cristãos de SEMANA SANTA pontua cada ano, queiramos ou não, cada dia desse lapso de tempo com características tão especialíssimas que dificilmente se encontre alguém insensível ao que então se celebra ou se comemora pelo menos em nosso país. Na década de 40 do século passado. eu residia em Petrópolis. Impressionava-me como a própria natureza anualmente gostava de participar das celebrações desse período, denominado tempo quaresmal e tempo pascal, cobrindo-se, inicialmente, com o roxo fortemente penitencial das quaresmeiras de tons variegados, e a seguir acolhendo em poético amplexo aquelas frondosa árvores recheadas de buquês de flores agressivamente douradas, recordando-me de que se aproximava a quaresma e em seguida a páscoa. E tantos anos volvidos, 60 pelo menos, contemplo-me jovem, na catedral, ainda sem a torre atual, assistindo à cerimônias do sábato santo. O diácono, avançando no templo, acendia sucessivamente cada uma das três velas da serpentina que carregava, entoando três vezes, e cada vez num tom de voz mais elevado, aquele simbólico e tocante "Lumen Christi" a que todos respondíamos comovidos "Deo Gratias". E ele mesmo, depois de receber a bênção do celebrante, cantava um dos mais belos e eloquentes cânticos litúrgicos que já ouvi: o chamado "Exultet"( "Exultet jam angelica turba coelorum..."). Hino de profunda gratidão pela noite "em que hoje " todos que no mundo inteiro creem em Cristo foram segregados dos vícios e das trevas dos pecadores, uma vez que obtiveram a restituição da graça perdida. "O FELIX CULPA QUAE TALEM AC TANTUM MERUIT HABERE REDEMPTOREM", cantou o diácono, sob a inspiração d e Santo Agostinho! Divino paradoxo! Ó bendita falta de Adão que nos mereceu revestir-se Deus do indumento humano, tornando-se o Filho, segunda pessoa da Santíssima Trindade, ao mesmo tempo Deus e Homem, para que fim? Para lavar nossas culpas. Para restituir aos caídos a inocência. Para Para dar a alegria aos tristes. Para afastar o ódio. Para estabelecer a paz. Para curvar os impérios! Que bela manhã pascal para uma autêntica ação de graças a Deus! Li hoje na Folha de São Paulo, dia 31/03/2010, a queixa de uma repórter, narrando a euforia dos cientistas pelas colisões que inauguraram o projeto de física do LHC, o seguinte: "Só não vi ninguém dedicando a vitória a Deus!"

quarta-feira, 24 de março de 2010

LIVROS CANÔNICOS E APÓCRIFOS

A BÍBLIA SAGRADA usada na IGREJA CATÓLICA contém 74 livros: 47 no ANTIGO TESTAMENTO e 27 no NOVO TESTAMENTO. Estes 74 livros são denominados LIVROS CANÔNICOS. "KANON", termo grego, designava uma "vara de medir" e, num sentido derivado, "regra"ou "norma". Foi o critério achado para designar livros que, divinamente inspirados, eram recebidos pela IGREJA CATÓLICA e reconhecidos por ela como a infalível regra de fé e prática, em virtude de sua origem divina. Donde: LIVROS CANÔNICOS. Com o tempo usou-se o termo CÂNON para designar a coleção ou catálogo dos livros bíblicos. Acontece, porém, que, enquanto a maioria dos livros da Bíblia tivessem sido sempre considerados como inspirados por Deus e como tais recebidos como regra de fé e de prática, constituindo assim os LIVROS PROTOCANÔNICOS ("próton = primeiro. em primeira instâancia), alguns outros, poucos, receberam a designação de LIVROS DEUTEROCANÔNICOS ("dêuteron"= segundo, em segunda instância) por serem escritos ou livros que foram primeiramente controvertidos, só depois entrando definitivamente no rol dos livros CANÔNICOS ou livros inspirados por Deus e tidos como tais. Frise-se o seguinte: o que houve foi uma inclusão desses livros entre os livros canônicos, em épocas posteriores, numa segunda instância, embora gozassem da mesma autoridade que os demais livros da Bíblia. Foi o Concílio de Hipona no ano 393 que definiu o cânon ou coleção completa da Bíblia. Paralelamente aos LIVROS CANÔNICOS temos os LIVROS APÓCRIFOS. Este termo APÓCRIFO era aplicado pelos católicos a escritos judaicos e cristãos que tiveram a pretensão à autoridade divina mas que de fato não são Escrituras inspiradas por Deus. Segundo Dom Estêvão Bettencourt, APÓCRIFO é o "livro não canônico ou não catalogado, embora tenha aparência de livro canônico (Evangelho da Infância, de Nicodemos, etc.). Se por bastante tempo foram considerados como livros desprezíveis, ultimamente são tidos como valiosos para a história do Cristianismo ("Escola "Mater Ecclesiae", Curso Bíblico Por Correspondência, Dom Estêvão Tavares Bettencourt).

SENTENÇA DE PILATOS

"Eu, PÔNCIO PILATOS, Presidente Romano dentro do Palácio da Arquipresidência, JULGO, CONDENO e SENTENCIO à morte a JESUS, denominado pela plebe CRISTO NAZARENO, originário da Galileia, homem sedicioso da Lei Mosaica contra o Grande Imperador TIBÉRIO CÉSAR. Determino e pronuncio por meio desta que sua morte seja na CRUZ com cravos a uso de reus, porque, congregando e juntando muitos homens ricos e pobres, não cessou de provocar tumultos por toda a Judeia, fazendo-se passar por filho de Deus e rei de Israel com ameaças à ruína de Jerusalém e do Templo Sagrado, negando o tributo a César e tendo tido ainda o atrevimento de entrar com ramos e em triunfo acompanhado de parte da plebe dentro da cidade de Jerusalém e no Templo Sagrado. Determino a meu primeiro Centurião quinto Cornélio que conduza publicamente pela cidade de Jerusalém a esse Jesus Cristo preso e flagelado, que seja vestido de púrpura e coroado de alguns espenhos, com a própria cruz nos ombros, para que sirva de exemplo a todos os malfeitores. Quero que com ele sejam levados dois dos ladrões homicidas e que saiam pela porta sagrada, agora Antonina, e que leve a Jesus ao monte público da Justiça, chamado Calvário, donde, crucificado e morto, penda o corpo na cruz, como espetáculo para todos os malfeitores. Que sobre a cruz seja posto o título em três línguas e em todas as três ( em hebraico, em grego e em latim) diga JESUS NAZARENUS REX JUDEORUM". NOTA: trata-se de uma cópia da sentença encontrada, em 1580, na cidade de Aquila, do Reino de Nápoles, dada por Pôncio Pilatos, presidente da Judeia no ano 18 (sic) de Tibério César, Imperador de Roma, contra Jesus Cristo, Filho de Deus e de Maria Virgem, sentenciando-o à morte de cruz no meio de dois ladrões no dia 25 de março. ( Confira Evangelho de Nicodemos em "Los Evangelios Apocrifos" por Aurelio de Santos Otero, biblioteca de autores cristianos, Madrid, MCMLXXXVIII).

sexta-feira, 19 de março de 2010

ET CONCEPIT DE SPIRITU SANCTO

25 DE MARÇO - DIA DA ANUNCIAÇÃO DE NOSSA SENHORA. " DIA do mistério DA IMACULADA CONCEIÇÃO DE MARIA, o mistério do privilégio, da exceção, da unicidade, da perfeição da Santíssima VIRGEM MARIA, única criatura humana que, por um desígnio divino (que sabedoria e que amor ele encerra!), em virtude dos méritos de Cristo, única fonte de nossa salvação, foi preservada de toda imperfeição, DE TODO CONTÁGIO DA FALTA ORIGINAL, de toda deformação do MODELO PRIMITIVO DA HUMANIDADE; a única por consequência na qual a IDEIA CRIADORA de Deus se reflete FIELMENTE e na qual se realiza a DEFINIÇÃO INTATA E AUTÊNTICA DO HOMEM: "IMAGEM DE DEUS". Luz, inteligência, doçura, profundidade do amor, beleza numa palavra, estão sobre a visão límpida e inocente da VIRGEM que nós honramos: "TOTA PULCHRA ES, MARIA!" Este pensamento bastaria para inebriar nossas almas que são tanto mais ávidas de humana beleza quanto a imagem humana que nos é oferecida nas múltiplas e quase obsessivas representações da arte figurativa é mais falsa, mais impudica, mais disforme, mais miserável. Que se detenha neste pensamento aquele que quiser, para restaurar a ciência da beleza, para descobrir suas relações transcendentais, para sua alegria interior e para seu comportamento exterior, reencontrar em MARIA a EXPRESSÃO MAIS ELEVADA, MAIS VERDADEIRA, MAIS REPRESENTATIVA DA ESTÉTICA ESPIRITUAL DO HOMEM" (Alocução de Paulo VI em 08/12/1966).

quinta-feira, 18 de março de 2010

CENTENÁRIO DE JOAQUIM NABUCO

Foi na década de 30 do século passado que, aluno do curso primário, JOAQUIM NABUCO entrou no meu consciente, quando do estudo na escola do abolicionismo. E neste ano de 2010 comemoramos o centenário de seu falecimento. E o faço, oferecendo aos seguidores amigos tópicos de uma intervenção sua, realizada na Câmara dos Deputados, no Rio, no dia 15/05/1879: "Eu desejava concordar com os nobres deputados em que se deveria deixar a liberdade a todas as seitas (religiosas); mas enquanto a IGREJA CATÓLICA estiver diante das outras seitas em uma situação privilegiada, os nobres deputados hão de admitir que ela vai fazer ao próprio Estado de cuja proteção se prevalece uma concorrência poderosa no terreno verdadeiramente leigo e nacional do ensino superior. Se os nobres deputados querem conceder maiores franquezas, novos forais à Igreja Católica, então separem-na do Estado. A Igreja Católica foi grande no passado, quando era o Cristianismo. Quando nascia no meio de uma sociedade corrompida. Quando tinha como esperança a conversão dos bárbaros que se agitavam às portas do Império minado pelo egoísmo, corrompido pelo cesarismo, moralmente degradado pela escravidão. A Igreja Católica foi grande, quando tinha que esconder-se nas catacumbas, quando era perseguida. Mas, desde que Constantino dividiu com ela o Império do mundo, desde que de perseguida ela passou a sentar-se no trono e a vestir a púrpura dos césares, desde que ao contrário das palavras do seu divino fundador que disse: "O meu reino não é deste mundo", ela não teve outra religião senão a POLÍTICA, outra ambição senão o GOVERNO, a Igreja tem sido a mais constante perseguidora do espírito de liberdade, a dominadora das consciências, até que se tornou inimiga irreconciliável da expansão científica e da liberdade intelectual do nosso século. Não sou inimigo da IGREJA CATÓLICA. Basta ter ela favorecido a expansão das artes, ter sido o fator que foi na história, ser a Igreja da grande maioria dos brasileiros e da nossa raça, para não me constituir em seu adversário. Quando o Catolicismo se refugia na alma de cada um, eu o respeito; é uma religião da consciência, é um grande sentimento da humanidade. Mas do que sou inimigo é desse catolicismo POLÍTICO, desse catolicismo que se alia a todos os governos absolutos, é desse catolicismo que em toda parte dá combate à civilização e quer fazê-la retroceder".

segunda-feira, 15 de março de 2010

13 - MARÇO 15

13 e 15 de março são datas que anualmente me falam muito silenciosamente. No dia 15 de março recordo-me de LUIZA DE MARILLAC, A FUNDADORA COM SÃO VICENTE DE PAULO das outrora por antonomásia chamadas IRMÃS DE CARIDADE. Ela, 10 anos mais nova que o Pai da Caridade, veio ao mundo no dia 12 de agosto de 1591, tendo descansado no Senhor no dia 15 de março de 1660, sete meses antes de São Vicente (27 de setembro). O abade Gobillon, no processo de beatificacão de Vicente de Paulo, declarou que, depois da morte de Luiza de Marillac, e durante bastante tempo depois, São Vicente sentiu um perfume particular em volta do túmulo da cofundadora das Irmãs de Caridade e que as irmãs que iam rezar junto dele o sentiam do mesmo modo, levando-o consigo nos hábitos e impregnando com ele os salões dos doentes que elas atendiam. As primeiras Irmãs de Caridade, vindas de Paris para o Brasil, chegaram a Minas no ano de 1849. Cento e dois anos depois, em 1951, foram pousar na casa-mãe dos padres lazaristas brasileiros, isto é, no CARAÇA. Este acontecimento é poeticamente enaltecido e comemorado no livro 'GUIA SENTIMENTAL DO CARAÇA", edição de 1953, escrito pelo lazarista "SARNELIUS", pseudônimo do Padre PEDRO SARNEEL, C.M. Que nasceu na Holanda no dia 13 de março de 1883. Apenas ordenado sacerdote no dia 5 de junho de 1909, demandou as terras brasileiras onde aportou no dia 31 de agosto do mesmo ano. Seu primeiro campo de semear, plantar e colher para os celeiros celestes deu-se no Caraça. Entre nós passou todos os seus dias, falecendo no Rio de Janeiro no dia 3 de julho de 1963 no Hospital da Penitência. Como um dos que com ele conviveram, guardo admiração inesquecível e sadia amizade pela dedicação que devotou ao nosso país. Se alguém quiser conhecer o CARAÇA, aceite um conselho: adquira e leia o "GUIA SENTIMENTAL DO CARAÇA" escrito por SARNELIUS. Quando este livro acabou de imprimir-se em 1953, eis o que revela o autor da apresentação da segunda edição, de 2005, Padre Lauro Palú, C.M.: "Lembro-me de quando contou ( o Padre Sarneel) do telegrama que Antônio Jacinto lhe quis passar de Belo Horizonte ao Rio: "VENHA LAMBER A CRIA". Os correios, continua o Padre Lauro, não aceitaram o telegrama e chegou outro mais comportadinho...Quem não ficou nada comportado foi o Pe. Sarneel, numa alegria de criança feliz, com a edição magnífica do Guia Sentimental do Caraça".

sexta-feira, 12 de março de 2010

THOMAS MERTON - 5

Da coleção CONVERTIDOS DO SÉCULO XX, número 9, é que colhi os fatos até aqui narrados. THOMAS MERTON faleceu, eletrocutado acidentalmente, em Bangcok, na Tailândia, no dia 10 de dezembro de 1968, pouco tempo depois de ter pronunciado uma conferência sobre o Marxismo e as Perspectivas Monásticas. "As últimas palavras dessa conferência, ditas no simples sentido de se retirar da sala, possuem, no entanto, um sentido simbólico: "So I will disappear" (Tristão de Athayde). Tinha 53 anos. Deste saudoso pensador católico brasileiro, ALCEU AMOROSO LIMA (1893-1983), aqui vai o que escreveu na orelha do livro de Thomas Merton "QUESTÕES ABERTAS": "Não conheço escritor mais completo, nos dias de hoje, do que THOMAS MERTON. Há, sem dúvida, personalidades maiores como teólogos, filósofos, poetas, romancistas ou críticos. Mas um escritor que reúna um pouco de tudo isso, e consiga integrar todas essas facetas numa personalidade que sabe dizer o que deve ser dito, com uma agudeza perfeita de estilo, no momento conveniente, não conheço outro. Ninguém vê melhor o mundo moderno do que ele. Ninguém sabe melhor as palavras que devem ser ditas ao homem moderno. Ninguém diz com mais severidade as verdades que o homem moderno precisa ouvir". Ao interessado em conhecer com profundidade THOMAS MERTON creio que de muito proveito será ler o livro "MERTON NA INTIMIDADE - SUA VIDA EM SEUS DIÁRIOS", editado por Patrick Hart e Jonathan Montaldo, Editora FISUS LTDA. "Thomas Merton andou aos tropeções para casa, mas chegou lá! Não mais um órfão ou exilado, não mais um solitário ou um filho pródigo, em companhia de todos os santos ele agora ouve, com toda a clareza, a voz do Amado. Sua viagem chegou ao fim. Seu espírito, perenemente à procura, descansa na paz de Deus" (P.H. e J.M.).

quarta-feira, 10 de março de 2010

THOMAS MERTON - 4

Com 26 anos, rejeitado para o exército, Merton decide consagrar-se a Deus. No dia de Ramos dirige-se à Trapa de Kentuki. Vivendo todas as horas do mosteiro, exclama: "Estes homens, sepultados no anonimato de sua cogula branca, fazem pelo seu país o que nenhum Presidente ou Parlamento pode jamais fazer, pois lhe asseguram a graça, a proteção e a amizade de Deus! "No seu íntimo, porém, teme que seu desejo de vida religiosa seja apenas uma grande ilusão. Assim indeciso, regressa a Nova Iorque. Empolga-o o apostolado social empreendido pela baronesa Hueck em favor dos negros do bairro de Harlem. Pouco depois, descobre Santa Terezinha que lhe sorrira numa noite: "Mostra-me, Terezinha, o que eu devo fazer; se for para o mosteiro, serei o teu monge!" Reconfortado, pacificado, resolvido, bate na porta do mosteiro da Trapa de Getsemani. Fechada a porta após entrar, exclama: "Encontrava-me preso entre as 4 paredes da minha nova liberdade. Era livre. Pertencia a Deus e não a mim. E pertencer-lhe é ser livre!" Tornara-se o "Irmão LUIZ". Como tal, contribui para a conversão de seu irmão John-Paul, aviador, que em julho de 1942 recebe no mosteiro o batismo e a primeira comunhão e morreria, nove meses depois, numa incursão aérea. Merton pronuncia os primeiros votos de religião na festa de São Tomé, de 1942. Ao Irmão Luiz pergunta seu "sósia", o escritor: "Tê-lo-ei acompanhado na entrada no mosteiro?" "A sua vocação, tranquiliza-o o abade, é escrever. Os dons de Deus devem empregar-se na glória de Deus!". Terminados os estudos eclesiásticos, ordena-se padre em 1949. Tinha 35 anos. "A MONTANHA DOS SETE PATAMARES", história do escarpado da rocha por onde ele teve de serpear, exigiu-lhe múltiplos patamares. "Sósia do Homem-Deus, Thomas Merton consagra agora para sempre sua vida a orar e a escrever, para maior bem dos homens e maior glória de Deus. Encontrara afinal a paz em Cristo" (fim no próximo encontro).

terça-feira, 9 de março de 2010

THOMAS MERTON - 3

Aos 35 anos, influenciado pelas leituras de Etienne Gilson e da Imitação de Cristo, Tomas Merton passou a substituir o ateísmo pela possibilidade de um mundo sobrenatural. Pensou mesmo em consagrar a vida a Deus pelo sacerdócio. Num domingo de agosto, entrou na pequena igreja de "Corpus Christi", em Nova Iorque. O templo estava lotado não de velhos, mas de homens, mulheres e crianças, predominando os jovens. Sentiu que os ouvintes estavam impregnados daquelas realidades. O Padre falava de Cristo, de suas naturezas divina e humana, da Redenção, da necessidade da graça. O convívio, porém, com amigos e amigas, os divertimentos costumeiros ainda o prendiam ao mundo. Rezava, sim, à noite, mas apenas uma Ave-Maria. Nisto o mundo se convulsiona: é a ameaça da guerra mundial. Seu nome aparece na lista dos milicianos. Lendo as "Cartas a Newman", de Hopkins, em via de conversão, dirige-se a Broadway. Na igreja de "Corpus Christi" pede o batismo. Encarrega-se de lhe ensinar a doutrina o Padre Moore, o que pregara naquela missa que tanto o impressionara. "O catecismo é uma das coisas mais prodigiosas que existe. Enraíza a palavra de Deus na alma de boa vontade. Eu sentia-me arder no desejo do batismo e não faltava a uma única instrução". A 16/11/1938 Tomas Merton recebe o batismo, confessa-se, faz sua primeira comunhão. Tinha 23 anos. "Mas, escreve, depois de tantas lutas, após aquele longo caminhar através de tão dilatados ermos, em lugar de me tornar um católico fervoroso, eu deslizava para as fileiras desses milhares de católicos de água doce, que apenas esboçam um pequeno gesto para conservar vivo em si o sopro da graça". "Desejava ser escritor, poeta, crítico, professor, gozar dos prazeres da inteligência, mas o prazer intelectual que o absorvia totalmente ainda não sabia transformar-se em amor". Em setembro de 1939, voltando a Nova Iorque, de repente, numa reunião de amigos e amigas, sente no íntimo da consciência um movimento profundo, a convicção clara de que viria a ser padre. Despede-se de sua "girl": "Peggy, adeus, vou ser padre! Depois fica sozinho. A noite cai e ele penetra na igreja de São Francisco Xavier onde nunca entrara, no momento em que se entoava o "Tantum Ergo". Das profundidades infinitas da Providência chegava-lhe de novo a pergunta: "Queres realmente ser padre?" Seduzido pelo ideal franciscano, obtém uma carta de apresentação para o convento de S. Francisco de Assis, de Nova Iorque. Com uma crise de apendicite, seu projeto fica para depois. Entretanto, comunga diariamente, lê assiduamente o "Paraíso" de Dante e a "Introdução à Metafísica"de Maritain. Em Douglaston na casa do tio e depois em Cuba na Páscoa de 1940 acaba de se restabelecer. Diante da pequeníssima Virgem Negra, a "Caridad del Cobre", pede uma vez mais a graça do sacerdócio, prometendo oferecer em honra de Maria a sua primeira missa. Chamado à inspecção militar, é declarado inapto para o exército: deficiência dentária; nem sequer serve para maqueiro! (continua).

domingo, 7 de março de 2010

THOMAS MERTON - 2

Thomas Merton nasceu em 31/01/1915, em Prades, na França. Falecendo-lhe a mãe aos 6 anos, foi viver com os avós maternos. Foi dos lábios da avó, que lhe ensinou o Pai-Nosso, que nele brotou o desejo de entrar numa igreja católica. Em 1930, falecendo-lhe o pai, o avô materno leva-o a conhecer a América. Durante a travessia do Atlântico, vive uma experiência com uma jovem, o que o transtorna de tal modo que se torna comunista. Regressa a Inglaterra onde viveu uns tempos com o pai. E em 1931, procura o rumo da Itália. Aí Deus o esperava!. "Foi em Roma, escreveu, "que a minha convicção se alicerçou; foi onde vi pela primeira vez Aquele a Quem agora sirvo como meu Deus e meu Rei e que governa minha vida inteira". Sentindo então aí um dia a presença quase física do pai falecido, caiu na conta da triste situação moral em que se encontrava. Entrou na igreja de Santa Sabina, ajoelhou-se diante do altar e rezou o Pai-Nosso com um sentimento de fé que nele alvorecia. Dirigiu-se à Trapa de "Tre Fontane", sem contudo se ter atrevido a estar com os monges. Chegado como turista a Roma, foi como peregrino que regressou à Inglaterra. Aí permaneceu até fins de 1934. No inverno de 1935 com 20 anos matricula-se na Universidade de Colúmbia. Dedica-se ao estudo do espanhol, do alemão, da literatura francesa, frequenta cinemas e "fraternidades", passa a publicar artigos e novelas, tornando-se muito ocupado. Não conhecia, porém, a Bíblia! Eis o que escreveu: "Assimilando tanta coisa, sentia-me vazio de tudo. E neste extremo de miséria e humilhação, fui vítima de uma aventura sentimental durante a qual procederam comigo como eu tinha procedido com tantas pessoas nesses últimos anos. Merecido castigo para aquele que como eu se assemelhava a um cachorrinho a mendigar carícias. Assim morria o homem, que eu sonhava vir a ser. Mas o meu fracasso foi ocasião da minha salvação!" Em fevereiro de 1937 caiu-lhe nas mãos "A história da filosofia na idade-média", de Etienne Gilson (1884). O "nihil obstat", porém, e o "imprimatur" estiveram a ponto de fazer-lhe pôr de lado o livro católico. Vencendo a repugnância, impressionou- se com a palavra "asseidade", termo pelo qual os filósofos exprimem que o "ser de Deus não tira sua razão de ser senão de si mesmo (a se ipso), termo que define ao mesmo tempo a perfeita liberdade de Deus que não depende de nada nem de ninguém". Compreende que a fé dos católicos não se cifrava em certa noção vaga e supersticiosa mas que se lhe revelava em todo o seu conjunto profundamente exata, simples e precisa". Em Colúmbia muito o influenciaram Mark van Doren, Ed. Rice e Bob Lax, além do judeu Meio-Hamlet, Meio-Elias, Seymour, Gibney, Gerdy e outros. "Ao estudar William Blake, cujos poemas escolheu para assunto de sua tese ao bacharelar-se em artes, convenceu-se de que a "a única maneira de viver é viver em um mundo saturado da presença de Deus". Lê as "Confissões" de Santo Agostinho", a "Imita'cão de Cristo", por sugestão do mais dinâmico de seus amigos, o pequeno monge hindu Bramachari". Nasce-lhe o desejo de entrar em contato com um sacerdote. Pode-se então afirmar que, pelo outono de 1938, estão lançados os alicerces de sua conversão ao Cristianismo" (continua).

quinta-feira, 4 de março de 2010

THOMAS MERTON - 1

Atencioso "seguidor"C.D.c.m.: "Tarde da noite. Os cafés de Paris tinham já cerrado as portas. Um táxi para, o passageiro segue um empregado pela porta giratória até o vestíbulo de um dos maiores hotéis da cidade. Pela mala pintalgada de etiquetas descobre-se um homem de negócios, importante. Ao tomar o elevador, sente alguém, uma mulher de hábito de monja, olhando para ele. Demasiado atarefado pela sua posição, como reconheceria pela capa branca e o burel castanho tratar-se de uma Carmelita Descalça? Surpreendente: a jovem sorri e sorri para ele! Rosto de francesa, cheio de candura, sorriso de franca e indisfarçada amizade. Ao assinar o registro, não se contém. Olha para trás. A freira desaparecera! Pergunta ao empregado: "Quem era a freira que estava ali?" "Perdoe-me, mas que diz o senhor?" "Aquela freira... quem era afinal? Aquela que acaba de sair e sorria para mim!" "O senhor está equivocado. Uma freira, num hotel, a esta hora da noite! Freiras não andam vagando pela cidade e sorrindo para homens!" "Sei disso! Por isso mesmo gostaria que me explicasse o fato de haver uma aparecido e sorrido para mim agorinha mesmo, aqui neste vestíbulo!" Encolhendo os ombros, o empregado respondeu: "O senhor foi a única pessoa que entrou ou saiu nesta última meia hora!" Tempos depois, o viajante que vira a freira trocara o terno por um burel pardo, com um escapulário pardo por cima e um grosso cinturão de couro afivelado na cintura. O mais misterioso aqui é que a história é verdadeira. Algum tempo volvido após a visão no hotel, deparou-se com um retrato da mesma freira e então lhe disseram que se tratava de SANTA TEREZINHA DO MENINO JESUS. Um dia encontraram-no de barba crescida, cabeça raspada, deitado debaixo de um trator, de burel e com manchas de graxa de eixo por toda a cara. Tornara-se TRAPISTA (" ÁGUAS DE SILOÉ", THOMAS MERTON).

quarta-feira, 3 de março de 2010

PARABÉNS, MINAS GERAIS!

Amanhã, 04 de março de 2010, comemora Minas Grais e o Brasil o centenário de nascimento do ex-presidente da República, TANCREDO NEVES. Como ponto central das justas homenagens prestadas ao ilustre filho das ALTEROSAS, o Governador do Estado de Minas, AÉCIO NEVES, neto do inteligente político mineiro, vai presidir, em Belo Horizonte, a inauguração da CIDADE ADMINISTRATIVA PRESIDENTE TANCREDO NEVES. O projeto, assinado pelo arquiteto OSCAR NIEMEYER, vai consolidar Belo Horizonte, definitivamente, como principal referência do trabalho de Niemeyer no mundo, como se lê no "Estado de Minas" do dia 28/02/10. De fato, 70 anos depois do projeto da Capela de São Francisco de Assis, da Pampulha, da Casa do Baile, do Iate Clube e do Cassino, "ícones da arquitetura moderna brasileira" ("Estado de Minas"), eis que surge, incensando o bairrismo mineiro, o mais novo projeto de Niemeyer, o PALÁCIO TIRADENTES. Conforme o prometido, até o próximo mês de outubro serão transferidos para o novo centro do governo mineiro 18 secretarias e 33 órgãos da administração direta e indireta do Estado. O complexo foi erguido às margens da MG-010, no Bairro Serra Verde, na Região de Venda Nova, a meio caminho entre o centro da capital e o aeroporto Confins. No dizer de Niemeyer ("Estado de Minas") o Palácio Tiradentes surpreende pela audácia de sua estrutura: quatro colunas sustentando o edifício. Em vez de o governo construir um conjunto com cerca de 20 edifícios, transformando o terreno em pequenos lotes, construiu apenas três. "Não é o ângulo reto, diz Niemeyer, que me atrai, nem a linha reta, dura, inflexível, criada pelo homem. O que me atrai é a curva que encontro nas montanhas do meu país. No curso sinuoso dos seus rios, nas ondas do mar, no corpo da mulher preferida. De curvas é feito todo o universo, o universo curvo de Einstein". A propósito: quando aluno no Caraça,ouvi, numa aula de História Natural, o profesor Padre Antônio da Cruz fazer a mesma observação de Niemeyer aplicando-a apenas, no caso, à estrutura do corpo humano.

segunda-feira, 1 de março de 2010

PERIQUITO versus JOÃO-DE-BARRO

Apenas uma das centenas das cidades de Minas Gerais foi administrada, durante quase cem anos, por dois tipos de aves: pelos PERIQUITOS e pelos JOÕES-DE-BARRO. Trata-se do município de BONFIM, distante 90 quilômetros de Belo Horizonte, à margem esquerda do Rio Paraopeba. A origem do nome dos dois partidos políticos é assim contada por Lúcio Urbano da Silva Martins, em seu livro "CIDADE DO BONFIM APONTAMENTOS HISTÓRICOS E NOTAS DE VIDA DE BONFINENSES ILUSTRES", PAG. 199: "DIZEM QUE, em razão de haver Oscar Marques da Silveira, no dia 29/06/1907, matado Caetano Baeta Neves Júnior, na "ponte da Rua Nova", houve profunda divisão política em BONFIM, embora o crime não tivesse qualquer conotação partidária. Apenas o autor do homicídio era irmão do DEPUTADO Carlos Marques da Silveira". Tudo levar a crer que, como o assassinado era adepto do partido do Dr. Francisco Alves Moreira da Rocha, que foi senador, deputado e agente administrativo da comarca, além de médico, criou-se uma animosidade entre esse e o deputado Carlos Marques da Silveira, irmão do assassino, também médico que exerceu na cidade a profissão até 1913. E mais: chegam então à terra dois irmãos farmacêuticos, José Venâncio Passos e Aristides Passos para combaterem (dizem!) o único farmacêutico em Bonfim, Custódio José da Silva Martins. Estava lançada a semente para a cisão na comarca do Partido Republicano, cisão que de fato ocorreu nas eleições de 1924, quando o advogado Olívio Villefort, liderando um grupo de personagens influentes da localidade formou um bloco opositor ao do Moreira da Rocha. " Em razão disso, Emílio Dornas, poeta satírico, colocou nome nos dois grupos antagônicos de: JOÃO DE BARRO (do SENADOR MOREIRA DA ROCHA) e PERIQUITO (de OLÍVIO VILLEFORT). E isto porque, em 1924, sendo o grupo de Moreira da Rocha ( os JOÕES DE BARRO) derrotado nas eleições, os PERIQUITOS (do grupo de OLÍVIO VILLEFORT) apoderaram-se da casa dos JOÕES DE BARRO. Com o fim da ditadura Vargas, em 1945, os JOÕES DE BARRO formaram o PSD e os PERIQUITOS tornaram-se os UDENISTAS (UDN), apenas LEGALMENTE! E o que ocorreu em 1964? Com a criação pelos donos do poder dos partidos da ARENA e do MDB, por razões de política mineira os JOÕES DE BARRO e os PERIQUITOS tiveram que se acomodar na ARENA, pois a adesão ao MDB seria um quase suicídio eleitoral. Como se realizou essa acomodação? Muito mineiramente, é claro! Como em Bonfim os JOÕES DE BARRO e os PERIQUITOS, à maneira dos judeus e dos samaritanos, não se davam ( non coutuntur judaei samaritanis), criou-se a ARENA I e a ARENA II. Os JOÕES DE BARRO embarcaram na ARENA I, e os PERIQUITOS ajeitaram-se na ARENA II. E quem discordou do golpe de estado formou o pequeníssimo bloco do MDB. A partir de 1988, com a volta do estado de direito, aquele espírito divisionista dos habitantes de Bonfim parece ter adquirido o ponto de saturação, depois de por tantas dezenas de anos ter contribuído não pouco para a marginalizaçào política da cidade. Os antigos bonfinenses, contudo, ainda costumam confessar-se com certa nostalgia: EU SOU JOÃO DE BARRO! EU SOU PERIQUITO!