domingo, 24 de agosto de 2014

TRISTÃO   POR   DENTRO


 TRISTÃO,  em carta de 10/05/1928 a Jackson de Figueiredo, conta que seu pai o forçara a fazer parte da Companhia de tecidos que dirigia. Diante do desinteresse pela indústria, pelos negócios da empresa, em janeiro de 1919 teve terrível discussão com o pai que deplorava o desinteresse dele pela função ocupada. Tudo numa conversa não amigável. "Disse-me várias coisas a respeito. E eu afinal repliquei, notando-se que acabava de cessar longo período de sucessivas greves, logo depois da Revolução Russa, com o operariado muito exaltado. E eu também, com o meu eu socialista de então". No meio da discussão disse ao pai: "Pois bem, vou lhe dizer a verdade, papai:  EU  PENSO  COMO  ELES, os operários em greve". E ele deu-me essa ducha gelada que me roeu as entranhas por longos anos. O pai respondeu: "Pois se pensa como eles, vá trabalhar por eles e não continue no seu lugar!". "Foi uma frase, escreveu Tristão a Jackson, apenas de bom senso. Mas ouvida naquele momento, você nem pode imaginar que horrível repercussão teve dentro de mim. Eu gaguejei qualquer coisa. Mas senti que estava irremediavelmente vencido e vencido por mim mesmo. Eu era a própria anulação, por absurdo,  de tudo aquilo que eu dissera. Dando-me ares de paladino libertário, invocando contra o velho burguês conservador (meu pai) os direitos e o espírito da nova gente, das novas ideias que surgiam da guerra (de 14) e que eram a expressão da Revolução Social, dando-me ali, vitoriosamente, como apóstolo da Ideia Nova, eu não ser mais do que um burguesinho excitado por leituras libertárias, mas que comia os cobres do velho industrial, valia-me de sua proteção para viver à custa da fábrica, da Companhia, que minhas veleidades de socialista acusavam de exploradora de operários, cuja causa eu fingia, ou antes, eu ardentemente não fingia não, mas de fato abraçava!"("Correspondência-Harmonia dos Contrastes", tomo II, pag. 103).

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