domingo, 17 de outubro de 2010

AINDA SOBRE OS MINEIROS SOB A TERRA

Aposentado, e,  por que não dizê-lo,  em espírito  de solidariedade às 33 vítimas que sob a terra do Chile sofriam horrores, acomodei-me no sofá e fui um dos milhões que assistiram à libertação dos cativos mineiros. Não queiram perguntar-me se em algum momento deixei de me comover!  Três cenas, porém, não consigo apagar da memória: minha atenta observação voltada ao garoto filho do primeiro operário alçado do túnel. A princípio dominado por nervosa expectativa estampada no rostinho moreno, parada a cápsula começou a tomar  consciência da realidade. O movimento de seus braços falaram pelos seus lábios. Era ele como se estivesse diante de um a figura de outro mundo que o assombrasse e ao mesmo tempo lhe transbordasse o pequeno coração de incontrolável alegria. E tudo isto após chorar tão alto que  lhe ouvíamos a voz como se possuído por um pesadelo. Mas, que corrida impulsionada como que  por molas em direção ao pai como se quisesse apoderar-se do melhor tesouro da terra! E que ternura e amor no abraço ao seu genitor,    tanto tempo em sonhos vislumbrado e ausente e saudoso! A segunda cena me deixou indeciso sobre a realidade do que me parecera ver. E somente bem depois do resgate de todos é que me  caiu a peteca. Em meio a tantas emoções coletivas, lacrimejantes muitas, deu-me pena o cosntrangido abraço do resgatado à jovem que, fingindo quase um sorriso, lhe  encaminhara o filho (ou filha) . Tive então  a impressão de apoderar-se da  mente dos dois um estado de espírito do tipo daquele  que eu,  que há dois anos perdi a esposa, experimento, pelo fato de me conscientizar de  que, durante a vida dela, muito  distante  estive de ter sido para com ela  o marido que ela tanto  merecera. Claro que a cena,  longe, muito longe de me chocar, apenas bastante  me penalizou, porque o casal viveu ali  momento de sentimentos sérios, de lembranças quem sabe doridas somente por eles explicáveis, mas, por certo, momento que há de lhes ter deixado cicatrizes de natureza que só eles avaliam. Uma terceira cena ali ocorrida me ficou ofuscada devido à minha imperdoável falta de espírito de solidariedade. E só fui tomar conhecimento dela, lendo o artigo da Folha de 16/10/10, da lavra de Walter Ceneviva:  "A festa afinal ocultou uma realidade: a distorção no tratamento aos mineiros como únicos herois. Herois no verdadeiro sentido da palavra são os seis homens que foram ao fundo da mina - voluntária e conscientemente - como gente do resgate ou de funções técnicas, para orientar a retirada. Saíram depois dos 33 mineiros. O que terá passado pela cabeça do último enquanto aguardava só, em silêncio, distante da superfície, a última viagem da cápsula? Esse foi o heroi dos herois."  Triste ironia atroz que o senso humano irrita" , como está no fim de "O acendedor de lampiões da rua", de Jorge de Lima! Tantas vezes citei e meditei e traduzi para o vernáculo o "Homo sum:  humani nihil a me alienum puto", de Terêncio, poeta latino (194-159 A.C.), enaltecendo a solidariedade, tantas vezes outras, contudo, não fui capaz de traduzir na prática a lição que me transmitia! 

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