quinta-feira, 25 de fevereiro de 2010

CIDADANIA - 1

" O assunto, iniciado agora em nosso encontro, é por demais importante. Situa-se, com efeito, no difícil domínio que é o do E N C O N T R O da HISTÓRIA, isto é, do domínio do que há de mais contingente e de mais empírico, com o ABSOLUTO, que é o da realidade soberana de DEUS e DAQUILO QUE ESTÁ ANCORADO NELE. Dá-se o nome de PROFECIA a essa junção ou encontro do TEMPORAL com o ETERNO. É ela a afirmação da presença do ABSOLUTO NO TEMPO, dando-lhe um sentido e o subtraindo de sua dispersão. Onde, porém, se encontra esse ABSOLUTO? Será que a pretensão de querer encontrá-lo nas coisas terrestres não constitui o perigo de o identificar com alguma dessas realidades? A PROFECIA é a DENÚNCIAÇÃO de todo tipo de IDOLATRIA. Entende-se por IDOLATRIA, por exemplo, aquela atitude que erige em ABSOLUTO as realidades políticas ou os sistemas econômicos. Ou a pretensão de um povo, ou de uma classe, ou de uma personalidade de se julgarem superiores aos demais humanos para, assim, justificarem o direito de oprimirem os outros. Essas IDOLATRIAS são de modo geral a expressão de orgulhos coletivos. A PROFECIA poderá ser também a AFIRMAÇÃO de que só há um ABSOLUTO que é DEUS e de que tudo o mais é CONTINGENCIAL. Ela é isso e também outra coisa. Duas observações nos assaltam, quando tratamos do presente assunto. De uma parte, nada é mais perigoso que os FALSOS MESSIANISMOS e os PSEUDO-PROFETISMOS. Se nosso projeto fosse importar o mito de um Estado ou Cidade terrestre ideal, se ele transformasse a mensagem bíblica na expectativa de um REINO-TERRESTRE, seria isto a pior traição da Bíblia. Não estamos aqui para nos divertirmos com tais sonhos. Sabemos que a realidade histórica é resistente, dura, que ela é um campo fechado em que o unido querer das nações e das classes se afrontam. Não acreditamos que se possa abordá-lo numa atmosfera de idílio. Há uma MATÉRIA HISTÓRICA que não se deixa dobrar à exigências das ideologias. Ela desmente as melhores e as piores. Ela é nossa esperança e nossa desesperança. Não pensamos, por outro lado, contudo, que a HISTÓRIA deva ser abandonada à FORÇA, ao DINHEIRO ou à ESPERTEZA. Se sua natureza é resistente, se ela não se deixa modelar ao nosso gosto, ainda assim não temos o direito de a abandonar à sua lei imanente. Nossa decisão então se impõe. Ela não pode, de outra parte, violentar impunemente certas leis fundamentais que não são os imperativos da consciência senão porque são fundamentalmente as leis do ser. A ÉTICA é uma componente da POLÍTICA. Esta não é uma pura técnica! Ela é desde Platão a CIÊNCIA DAS LEIS que devem reger a CIDADE DOS HOMENS. E porque essa cidade é constituída de seres humanos, ela deve levar em consideração a NATUREZA HUMANA e o DESTINO do ser humano. Os problemas da humanidade presente não podem reduzir-se a problemas de pura técnica. Eles implicam em opções para o homem. E assim somos obrigados desde então a introduzir a PROFECIA no seio do MUNDO DA TÉCNICA na medida em que só ela dê sentido a essa técnica" (Jean Daniélou, filósofo francês, 1905-1974). O assunto continuará.

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